Adrenalina é o novo livro da poetisa e argumentista
Filipa Leal. Neste poemas inéditos, a autora faz o balanço de uma vida que passa, quer queiramos ou não, acelerada e intempestuosa, da qual extrai pequenos e grandes momentos que versa em tons que vão do humor à introspeção. Para abrandar a adrenalina dos dias, Filipa Leal versa sobre a família, a amizade e o amor, numa espécie de polaroides biográficos capazes de combater as agruras dos dias.
Antes que os ursos vão hibernar este inverno, conheça este «urso americano», uma prova do quão importante é rirmo-nos de nós próprios. E do quanto a vida nos surpreende, sempre.
O URSO AMERICANO
É o único urso da América Latina,
narrava o locutor da National Geographic
quando entrei na sala do meu pai.
O meu pai sempre gostou de ver estes programas,
pegou-me a mania.
Sentei-me, perplexa, a olhar para o urso.
Era domingo de manhã, tinha dormido pouco.
E, regra geral, sou literal. Acredito no que me dizem.
Não percebi logo que se tratava da úniva espécie de ursos.
Mas só há um urso na América Latina?, perguntei.
Fiquei preocupada: se é o único urso,
Como é que se vai reproduzir?
(O que pensei. Mas tive vergonha de dizer, foi: com que animal.)
Podiam ao menos levar-lhe outro urso, pai,
um urso europeu, por exemplo,
para o urso americano não se sentir tão sozinho.
O meu pai nem teve tempo de me responder.
É assim na televisão como na vida:
rapidamente, entrou outro urso.
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